segunda-feira, julho 12, 2010

( 6 ) Comentários

É pra cheirar (O pão nosso de cada dia...)


No perímetro da pequena mesa estavam assentados à espera da refeição noturna que seria colocada pela matriarca da família. A mesa era tão pequena que facilmente se estendia a mão de uma extremidade a outra, mas era suficiente para compor os pratos e mais um pouco.

Tudo pronto. Fecharam os olhos para elevar uma prece de agradecimento ao Pai. E ainda não sabiam que o melhor estava por vir.

Todos os pratos eram iguais. Os mesmos caroços marrons e rubros de feijão boiavam no abundante caldo pouco temperado em todos os recipientes. Mas tinha seu bom sabor. O problema era que depois de uma semana ingerindo a mesma coisa já fazia a garganta arder um pouco ao degustar o caldo.

O menino com olhar miúdo contemplava os caroços quando algo foi colocado no prato e levemente submergiu entre o feijão.

Curioso, ele quis saber o que era, mas ela apenas lhe respondeu que “era para cheirar”. Ironia, claro.

Tratava-se de um pequeno pedaço de bacalhau, propositalmente salgado, ganhado ainda na Semana Santa.

Aquele pequeno pedaço de peixe instigava o sorriso no rosto do menino. Este que há mais de uma semana via a mesma cor em seu prato, agora o via colorido por um singelo pescado branco no meio do marrom.

Assim, todos mergulhavam a colher no caldo e desfiavam delicadamente o bacalhau. O sal era-lhes a novidade depois de dias.

Ao terminar, levantou-se primeiro o miúdo. O feijão já não pintava seu prato, mas o petisco ainda sobrara por lá.

Quando o pai perguntou-lhe se não iria comer tudo, já de pé e notavelmente feliz com a novidade, respondeu:

- Vou guardar para cheirar amanhã também.

Imagem Via morgueFile

6 Responses to " É pra cheirar (O pão nosso de cada dia...) "
13 de julho de 2010 às 18:05
Adoro histórias e a sua me fez viajar. Me levou à casinha de mesa pequena, até imaginei o braço estendido, a mão na outra extremidade.

Apesar do amargo, algo de doce transborda
de suas palavras. Paz!
Continue escrevendo contos, você os constrói muito bem.
14 de julho de 2010 às 13:51
Essa história nos faz refletir.
Belíssimo texto.
Bjs
17 de julho de 2010 às 13:47
Voltei ansiosa para ver se tinha outro conto. Gostei tanto deste...
24 de julho de 2010 às 11:46
Seu blog foi citado na nossa sessão de links semanais.
Abraço!

Anselmo
30 de julho de 2010 às 06:17
Sena esta tua história é um exemplo de que apreciamos mais tudo o que é raro, tudo aquilo que não podemos usufruir com facilidade. Na sociedade actual cae-se em exageros e as coisas perdem o valor. Já há muito que estava para te visitar, para desejar que estejas já bem. Um beijinho
8 de agosto de 2010 às 20:39
RSrsrs tadinho

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